segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Virando a página

Quando viramos a página, as tristezas ficam para trás; as alegrias, efêmeras, se diluem, pois estar ali, com aqueles que nos feriram, impõe uma pausa de ressentimento.

Ao mesmo tempo, virar a página traz consigo uma certa nostalgia do que já foi, do que nunca mais voltará, do que se perdeu para sempre.

Na verdade, a página não se vira: apenas nos damos conta de que ela está chegando ao fim. E, diante desse fim que nos aguarda a todos, algumas coisas deixam de ter importância, se é que algum dia tiveram. Para alguns, tiveram, sim: morreram e mataram para defendê-las, como nos lembra o filme Relatos Selvagens. Defender o quê, afinal? E para quê?

quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Por que ele tem agorafobia?

Aprendeu a viver sozinho desde a infância. Foi obrigado a lidar, quase naturalmente, com tudo o que lhe era imposto nos aspectos sociais — e, mais tarde, com as tragédias da vida. Tragédias que todos atravessam, em maior ou menor intensidade, e que em nele deixaram a marca do recuo. Passou a observar mais e participar menos.

O que o incomoda é ser convocado a falar, mesmo que seja apenas uma amenidade.

A opinião que pedem não importa; importa apenas que ele esteja ali, preenchendo espaço. E é justamente aí que algo lhe dói: ser arrancado do seu silêncio. Esse silêncio que lhe protege, que é confortável, e que, quando violado, lhe faz querer desaparecer.

Foi então que decidiu: não gosta de gente. Gosto de vínculos. Mas vínculos não se estabelecem com todos, e essa impossibilidade é o que mais pesa.

quarta-feira, 3 de setembro de 2025

a caixinha do fim

Hoje pagamos a caixinha do fim.

Foi barata.

A morte anda em promoção.

E isso só pode significar uma coisa:

valemos pouco.

Muito pouco.


Penso sempre nisso:

tudo virou nada.

Virou memória sem ouvidos,

fotografia que ninguém quer rever.


Ninguém vê mais fotografia.

Todos tiram,

mas não para ver 

apenas para mostrar.


Às vezes, mesmo sendo profundamente triste, é bom lembrar da caixinha.

Ela confirma o nada que é nosso,

e que é grande

para quem o viveu.


Talvez seja melhor assim.