sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

Para o novo ano que se aproxima


Por Paulo Lima


Estamos perplexos, caminhamos sobre dúvidas e nos deitamos ásperos. O tempo se comprime, vivemos como se repetíssemos o dia anterior e o antepassado, falta-nos o ar e decidimos não mais caminhar ao léu. Não mais sonhamos com viagens, falta-nos dinheiro, falta-nos vontade, falta-nos a ilusão de que amanhã respiraremos fundo e o ar novamente nos será leve. Falta-nos amigos, embora tenhamos tantos conhecidos. Mas não abandonamos a ideia de construirmos diariamente uma nova casa. Labuta sobre labuta, uma após a outra, tecemos a teia que desvenda o incógnito e afasta o falso. Abolimos o temor e ousamos dar nome às coisas. Nenhuma autoridade nos controla ou dita o rumo dos nossos pensamentos e atos, a não ser nós próprios. A isso se diz ser consciente, fardo ingrato. Pode parecer pintado em obscuro, ser evanescente, é, porém, da cor dos nossos passos. Vivemos o trânsito ao imponderável, terrível saber nosso destino repousar em mãos alheias. Não há como furtar-se a este fato. Viver é uma aventura, a atenção nunca repousa. É assim que se atravessa tempos símiles, outros já houveram em nossa milenar paixão terrena. Nossos ancestrais se afadigaram em longas e incertas travessias e nos legaram este mundo devassado, complexo, impreciso. Levantemos, pois, as taças rubras do sangue da terra, bebamos o vinho que nos irmana e, juntos, prossigamos nossa jornada lenta, lentíssima e incerta, mesmo sabendo estarmos à beira do colapso, meio perdidos nas brenhas do acaso. O que importa é estarmos juntos e jamais trilhar o caminho dos penhascos. Juntos novamente chegaremos a um novo mundo.

São Paulo, 24 de dezembro de 2023