domingo, 29 de janeiro de 2017

Enegrecer



Por Raquel Gouveia 

Panteras Negras 

Sempre que corto o cabelo sinto o mundo de forma diferente, pois ele se torna ainda mais difícil. O peso dos meus cachos  simbolizam um embranquecimento que disfarça o peso do "racismo nosso" de cada dia. Ao cortar o cabelo para deixá-lo ainda mais crespo e assumir o meu lugar de mulher negra em uma sociedade machista, misógina e racista tornou-se uma escolha completamente difícil. Enegrecer me coloca em um lugar marginal e extremamente dolorido. 

O racismo é sutil na maioria das vezes, mas há momentos que ele despedaça a alma... 

Vejamos:

Minha mãe que é branca de olhos azuis torna-se minha patroa e eu sua "acompanhante"; Meu marido que é branco ao irmos ao shopping torna-se "minha garantia" de que serei bem atendida, pois ele aparenta ter dinheiro para pagar;

Sempre que vou ao cinema, ao teatro, ao museu e etc não localizo outras pessoas como eu, ou sejam pessoas negras. Somos poucos a termos acesso a esses lugares;Ao andar pelas ruas torno-me um sujeito que representa o medo, o perigo e a violência, pois minha negritude simboliza a marginalidade. As senhoras seguram as bolsas com tanta força que nem percebem que a minha mochila possui um valor financeiro maior do que elas transportam;

Ao pegar um Uber, o motorista sempre acha que é a outra mulher (branca) que o chamou e se assusta quando bato no vidro para poder entrar;Sempre que vou a farmácia da esquina para comprar algo, o segurança, que também é negro, fica me seguindo com os olhos para verificar se não estou roubando;Nas lojas quase nunca as vendedoras esperam que eu faça compras e quase nunca me atendem;

Ao frequentar festas quase sempre sou a única negra convidada e os demais negros são trabalhadores;

Quando subo a rua de casa tarde da noite acredito que posso ser assaltada e esqueço que a pessoa que está do outro lado da rua está apavorada e correndo de mim.
Posso ter doutorado, posso dar aula na universidade pública, posso ter acesso cultural, social, político e econômico, mas ao enegrecer nada disso importa. Posso andar cheirosa e com os melhores perfumes, posso ter estudado na Europa, posso falar dois ou três idiomas, posso publicar artigos e livros, posso ter ido a França, Inglaterra, Espanha, Holanda, Bélgica, Argentina e demais países quantas vezes eu quiser, posso continuar estudando, posso comprar roupas caras... Porém....

Sempre vão me lembrar e dizer que sou negra e que não posso estar ali. 
Até dizem que esse tal de racismo não existe, só que ao Enegrecer ainda mais, posso afirmar que o sinto cada vez mais forte todos os dias... Não sabia que o peso dos meus cachos significava tanto para a sociedade e que cortar o cabelo me aproximava de um povo que nunca me disseram que era meu. 

Apenas cortei o cabelo...

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Inside Job - Existem coisas pelas quais vale a pena lutar.


O documentário de 2010 Inside Job (Trabalho Interno) detalha a forma corrupta e bem elaborada dos agentes financeiros norte americanos desde a crise de 2008. Em cinco partes o documentário demonstra o ambiente político que ajudou a criar a crise financeira, levando milhões a pobreza, desemprego e perda de suas casas por meio de hipotecas. A desregulamentação é um principio do capitalismo, entretanto o mercado não é uma mão invisivel proposta por Adam Smith e seu liberalismo econômico, ao contrário os mercados possuem os arrimos estatais, midiáticos e acadêmicos, o documentário desvela o papel de cada um nesta promiscuidade. 

Apesar de complexo como uso em sala de aula, considero importante debater com os alunos o quanto a financeirização está posta em todos os âmbitos da vida. O documentário ainda demonstra o quanto a ciência académica, produzidas por grandes nomes nas Universidades norte americanas, também está rendida a este jogo uma  vez que acadêmicos norte americanos fazem pequenas fortunas auxiliando e criando bases teóricas para as políticas governamentais, prestam consultorias por meio de empresas privadas e os banqueiros, obviamente, recorrem a estes serviços. Como por exemplo, os renomados Martin Feldstein ou Laura Tyson que são professores universitários de Universidades de ponta e ganham milhões pautando falsas respostas à sociedade e as propagam desde que os financeiros paguem. Ou seja, criam e elaboram teorias que não vão resolver os problemas sociais, fazem apenas sob pagamento obtendo lucro da miséria alheia. 

Inclusive na visão do diretor do documentário transparece a ideia que o capital financeiro a 40 anos atrás era bom, quando sabemos que nunca foi assim que os Estados Unidos por meio dos capitais financiaram guerras e ditaduras em outros países como forma de lucro. Penso ser uma visão nacionalista de Charles H. Fergunson. 

Segue o trailer do filme...
Na próxima postarem vou elaborar algumas atividades para uso em sala de aula. 




ES



terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Socialismo do Século XXI, um conceito perdido nas brumas.

Entrevista especial com Elaine Santos
Por Ricardo Machado | Edição Patricia Fachin – IHU On-Line





Embora Correa tenha resgatado a premissa bolivariana, que abrange a luta pela emancipação conjunta dos povos e um enfrentamento direto aos Estados Unidos (…) seu aclamado socialismo do Século XXI resumiu-se na reconquista da capacidade estatal de absorção dos excedentes”, avalia Elaine Santos, socióloga, ao comentar o mandato de Rafael Correa como presidente do Equador.
Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail, Elaine Santos faz uma retrospectiva das principais políticas do governo Correa e comenta os conflitos em que o então presidente esteve envolvido ao longo dos últimos dez anos, como a exploração do Parque Yasuní. “A iniciativa Yasuní ITT em 2007 foi ousada, pois era uma proposta da sociedade civil que foi retomada pelo governo e consistia em deixar debaixo da terra a reserva petrolífera dos blocos ITT (Ishpingo, Tiputini e Tambococha), cerca de 920 milhões de barris de petróleo, desde que os países centrais seriam corresponsáveis no pagamento dessa não exploração, reconhecendo sua dívida ecológica. Alguns países aderiram, outros alegaram viver um momento de crise para arcar com tal responsabilidade. Tal situação clarificou a falta de compromisso dos demais países com a aclamada e modal questão ambiental. Posto isso, em 2013 o governo voltou atrás e resolveu explorar o bloco petrolífero utilizando a alegação que a exploração era necessária para manter os investimentos em estradas, serviços públicos e educação”, relembra. Por outro lado, critica, “os movimentos indígenas e ecologistas, que defendiam a não exploração do bloco, não apresentaram uma contraproposta concreta como alternativa de desenvolvimento para este país, que possui uma economia pautada no extrativismo e ao se beneficiar da subida dos preços de petróleo, conseguiu viabilizar essa renda em programas sociais importantes”.
No próximo dia 19 de fevereiro, os equatorianos escolherão seu novo presidente e, segundo Elaine, o sucessor de Correa, Lenin Moreno, tem aparecido na frente nas últimas pesquisas. “Ele é o candidato escolhido para suceder Rafael Correa, portanto sua plataforma principal é dar prosseguimento àquilo que alguns denominaram Socialismo do Século XXI, mas que agora já aparece como um conceito um pouco perdido nas brumas”. A socióloga informa ainda que há uma “grande fragmentação entre os setores da esquerda” que elegeram Correa e que parte da esquerda descontente aposta no candidato Paco Moncayo, mas ele aparece nas pesquisas com 7% das intenções de votos.
Elaine Santos é socióloga, mestre em Energia, Sociedade e Meio Ambiente, pela Universidade Federal do ABC – UFABC e atualmente cursa o doutorado em Sociologia no Centro de Estudos Sociais – CES, na Universidade de Coimbra, em Portugal.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Qual o atual cenário político e econômico no Equador?
Elaine Santos – Não há dúvidas de que Correa foi de longe um dos melhores presidentes que o Equadorjá teve, garantiu estabilidade política, como afirmou Boaventura de Sousa Santos . Em 10 anos ele derrotou os sharks midiáticos, enfrentou uma tentativa de golpe policial militar, venceu referendos, assembleias constituintes e aprovou uma das Constituições mais bem elaboradas da América Latina, com institutos de democracias participativas internos que também tiveram grande relevância neste processo.
Em 2015, com a queda dos preços de petróleo, o governo sofreu uma forte crise, viu sua receita cair e consequentemente diminuiu os investimentos em políticas sociais. A alta do dólar também prejudicou o país, uma vez que dolarizado desde 2000, quando deixou de ter uma moeda própria, teve problemas na obtenção de novos financiamentos. Atualmente o país vivencia a preocupação com a crise mundial, a incerteza perante um novo governo e a reconstrução de sua área litorânea atingida por um terremoto em 2016.
IHU On-Line – Após dez anos de mandato, qual o legado deixado por Rafael Correa?
Elaine Santos – Acredito que o atual presidente deixará um legado importante para o Equador. Considerando que o país viveu um período de ingovernabilidade muito marcante no período de 1992 a 2006, por exemplo, em que nenhum presidente havia conseguido cumprir seu mandato até o final. Neste sentido, já é histórico que ele tenha se mantido 10 anos no poder.
Em 2006 Correa foi eleito com grande apoio dos movimentos sociais e indigenistas representando a mudança e o alento para este povo que seguiu assolado desde a onda neoliberal da década de 90.
No início do seu mandato (2007) o Equador passou por reformas importantes, entre elas, o estabelecimento de uma nova Constituição aprovada em referendo popular e considerada uma das mais avançadas da América Latina. O texto constitucional se movia no sentido de uma maior intervenção estatal na economia, principalmente no que se referia à exploração dos recursos naturais, bem como alocar o povo, a vida e a sociedade como razão de ser do Estado. Neste sentido o texto aprovado se pauta na Refundação do Estado em termos etnicamente mais justos, na plurinacionalidade (reconhecimento dos povos e suas culturas), no Buen Vivir e no reconhecimento da natureza como um sujeito de direitos. Deste modo, permitiria um desenvolvimento embasado em outro tipo de relação com a natureza, a partir das reivindicações de igualdade e de justiça social.
O grande desafio do presidente durante todos os seus mandatos foi conciliar a Constituição aprovada, alicerçada no respeito ao meio ambiente e aos povos tradicionais, com o desenvolvimento econômico do país. Nesse sentido o presidente realizou uma batalha incisiva na justiça contra a Chevron, denunciando a empresa em relação à contaminação de vasta área amazônica quando explorou petróleo no país (1964-1992). Auditou a dívida pública e constatando inúmeras irregularidades conseguiu reduzir o valor do pagamento, revertendo tais benesses em políticas sociais, fato que melhorou muito os índices sociais e segurou a economia perante o cenário mundial de crise.

Modernização do capitalismo equatoriano

Correa modernizou o capitalismo equatoriano, apesar disso não alterou o modelo de acumulação, tampouco criou estruturas para tal. Por outro lado, realizou políticas de cunho social relevantes. Nos últimos oito anos 1,3 milhão de equatorianos saíram da pobreza por meio do consumo (segundo dados do INEC), sete de cada 10 habitantes tiveram acesso à água potável, o PIB (Produto Interno Bruto) aumentou de 1,6 mil para US$ 6 mil e a pobreza que em 1999 atingia 80% da população foi reduzida em 2012 para 30%. O desemprego, que beirava 10% há nove anos, hoje está em torno de 4,6%.
Firmando os objetivos de desenvolvimento do Milênio, também executou uma série de políticas voltadas à transferência de renda às famílias. Ainda que estas sejam políticas voltadas para cumprimento de uma das sanções da Organização das Nações Unidas, iniciada no ano de 2000, para erradicação da pobreza como item prioritário, não podemos discutir que a implementação desta política fez diferença para o pobre.
A questão central aqui não é redistribuição de renda, e sim, o que gera a vergonhosa pobreza? Dessa resposta teremos uma política mais efetiva que não seja a de assegurar um patamar mínimo de reprodução social, e sim vencer a pobreza.
IHU On-Line – Em contrapartida, como compreender o desgaste de Rafael Correa frente às comunidades indígenas, sobretudo no que diz respeito à extração de petróleo no Parque Yasuní e o descumprimento de outras promessas?
Elaine Santos – Os dois primeiros mandatos de Correa tiveram algumas perturbações e até uma tentativa de golpe, mas por fim foram exitosos. No seu último mandato houve uma grande fragmentação entre os setores da esquerda que o elegeram. Esses setores passaram à oposição e os setores da direita, obviamente, aproveitaram-se desses flancos para desgastar a imagem do presidente.
Correa atravessou diversos momentos incompatíveis entre discurso e prática, por exemplo, quando tratou a questão de gênero e homossexualidade como uma anomalia; quando ameaçou se demitir diante da despenalização do aborto; quando deixou de dialogar com as bases sociais indígenas que o elegeram agindo com truculência. Assim, houve críticas, protestos e manifestações contra o presidente, que foi um dos poucos na América Latina que se titulou anticapitalista e antineoliberal.

Críticas ambientais

Diante de tais equívocos, o atual presidente angariou um amplo leque de opositores dentre ecologistas, movimentos indígenas, políticos da esquerda e da direita, como era previsto. O Parque Yasuní foi um ponto central nesse debate, já que o presidente deliberou sua exploração ante o não pagamento da Moratória que ele havia proposto aos países centrais. A iniciativa Yasuní ITT em 2007 foi ousada, pois era uma proposta da sociedade civil que foi retomada pelo governo e consistia em deixar debaixo da terra a reserva petrolífera dos blocos ITT (Ishpingo, Tiputini e Tambococha), cerca de 920 milhões de barris de petróleo, desde que os países centrais seriam corresponsáveis no pagamento dessa não exploração, reconhecendo sua dívida ecológica. Alguns países aderiram, outros alegaram viver um momento de crise para arcar com tal responsabilidade. Tal situação clarificou a falta de compromisso dos demais países com a aclamada e modal questão ambiental. Posto isso, em 2013 o governo voltou atrás e resolveu explorar o bloco petrolífero utilizando a alegação que a exploração era necessária para manter os investimentos em estradas, serviços públicos e educação.
Correa foi acusado de extrativista intransigente, uma vez que essa decisão deveria passar por referendo popular. E mesmo garantindo que usaria as melhores técnicas com o menor impacto possível, o presidente enfrentou uma série de manifestações que o acusavam de desrespeitar a Constituição por ele aprovada em 2008, que proíbe a exploração de recursos não renováveis em áreas protegidas. Dessa contenda, Correa perdeu apoios importantes e acabou por beneficiar os chineses que aguardavam a exploração do Parque Yasuní em acordo previamente firmado.
Por outro lado, os movimentos indígenas e ecologistas, que defendiam a não exploração do bloco, não apresentaram uma contraproposta concreta como alternativa de desenvolvimento para o país, que possui uma economia pautada no extrativismo, e ao se beneficiar da subida dos preços de petróleo, conseguiu viabilizar essa renda em programas sociais importantes. Como realizar tais melhorias sem a exploração?
E nessa lógica cabe acrescentar que, mesmo por meio da exploração e da melhoria dos índices sociais, Correa não enfrentou os constrangimentos estruturais e históricos do subdesenvolvimento do Equador. A meu ver este é ponto central da crítica que deveria ser feita ao atual presidente, já que, mesmo defendendo a natureza com base na premissa da Pacha Mama, como discursam os defensores da natureza ontológica, não conseguiremos disciplinar o capital. Não temos sequer uma solidariedade internacional acerca da questão ambiental, quiçá uma mudança de consciência imediata; essa é uma utopia importante, porém pouco exequível.
IHU On-Line – Analisando em um sentido mais amplo, de que forma podemos entender a gestão de Rafael Correa no contexto latino-americano?
Elaine Santos – Dos trabalhos recentes que fazem esta avaliação, o que acompanhamos durante o período de Correa foi um remodelamento das relações de dependência. Embora Correa tenha resgatado a premissa bolivariana, que abrange a luta pela emancipação conjunta dos povos e um enfrentamento direto aos Estados Unidos, por meio da recusa do fornecimento de petróleo e da afronta diplomática dando asilo a Julian Assange (fundador do Wikileaks e buscado pelos EUA por revelar informações sigilosas), seu aclamado Socialismo do Século XXI resumiu-se na reconquista da capacidade estatal de absorção dos excedentes.
Segundo James Petras, “ele afirma ser socialista, mas condena as FARC marxista e louva o ‘neoliberalismo’ do regime colombiano; questionou a dívida externa ilegal (reduzindo-a em 60%) e ao mesmo tempo mantém o dólar como a divisa do Equador e abre territórios indígenas à exploração do capital estrangeiro”.
No contexto latino-americano, os países fortaleceram parcerias em alguns setores importantes, como o energéticos, por exemplo. Correa também procurou alianças com os países asiáticos e africanos, propondo instalação de embaixadas. Além disso recebeu empréstimos altíssimos a juros baixos da China, em troca de investimentos petrolíferos.
IHU On-Line – Por que é tão difícil, mesmo promovendo mobilidade econômica e social para as camadas mais empobrecidas da população, modificar as macroestruturas políticas e sociais da América Latina, especialmente no caso equatoriano?
Elaine Santos – Há um rebaixamento do nível teórico e da própria prática transformadora nos partidos considerados à esquerda. Como afirma James Petras, para Washington as políticas extrativistas nacionais e populistas são compreendidas como um regime socialista radical de Correa, até por sua aproximação com a Venezuela. A aposta de Correa, baseada na exploração de recursos naturais, cria um ciclo dinâmico, entretanto o país permanece suscetível às oscilações dos preços de petróleo e crises mundiais, ou seja, permanece subordinado aos desmandos imperialistas.
Neste capitalismo de laços e de coalizão, quando o “centro-esquerda” conquista o poder, ao invés de múltiplas transformações, o que aparece são contratos com multinacionais, com construtoras e seus megaprojetos favorecendo o grande capital com um verniz de distribuição social. Distribuição esta que desemboca na marginalização de qualquer possibilidade de transformação estrutural. Nesta conjuntura permanecem apenas as transferências de rendas pautadas em programas sociais, um Estado “democratizado”, todavia facilmente penetrável pela classe dominante, que hoje atualmente faz uso apenas das leis para destituir governantes quando estes não atendem seus interesses.
Tal análise transcende o contexto Correísta e perpassa toda América Latina, claro, respeitando os particularismos do modo como o grande capital age em cada país. A esquerda do Socialismo do Século XXI abandonou a luta por um novo ser humano e isto ocorre devido a uma carência doutrinária, decorrente do descarte do marxismo soviético, aliada à urgência de solucionar os problemas deixados pelo neoliberalismo da década anterior. Isto é, solucionar, mas sem enfrentar e criar mecanismos contra as ofensivas da direita. Em suma, acabam por governar o subdesenvolvimento melhor que a direita, já que aliviam a situação dos mais pobres, deixando as estruturas econômicas intactas. O que opera na América Latina é a continuidade da contrarrevolução capitalista em desfavor dos assalariados e conforme a continuidade aprofundada da subordinação imperialista da nação, nossa subalternidade historicamente construída.
IHU On-Line – Nós, os latino-americanos, estamos condenados ao subdesenvolvimento e suas mil faces ou há vida politicamente sustentável fora da “Ordem mundial”? Como?
Elaine Santos – É complicado responder assim de imediato, como futurologia… (risos). Entretanto, em uma análise dialética, podemos dizer que nosso desenvolvimento ocorre somente por meio do subdesenvolvimento. E a historiografia aparece como um dado fundante neste caso, já que é ela que nos vai permitir entender a especificidade da situação latino-americana e a essência dos problemas aqui existentes, e esta não é uma tarefa simples.
A economia latino-americana possui singularidades que a impedem de desenvolver-se como nos países centrais, fato que está condicionado a sua própria inserção do capitalismo, realizada sob a égide colonial.
Minha leitura é que aqui, no nosso continente, o capitalismo só é possível de maneira subordinada, porque fomos incapazes de criar um estatuto nacional autêntico. Ou seja, herdamos estruturas coloniais e neocoloniais constrangedoras que nos amarram e ao mesmo tempo temos que fazer frente ao capital monopolista. Logo, quando a correlação de forças se altera para o bem e para o mal, aparece como um freio para mudanças maiores, seja por via de golpes, de mudanças constitucionais e da manipulação de forças que possam barrar qualquer possibilidade de alteração.
Mas… a história continua e como dizia Debray, “cada vez que a cortina se levanta, é preciso deslindar novamente os fios da trama”, logo não estamos condenados… o que define as alterações sociais e o amadurecimento da luta e consciência da necessidade de transformação e a certeza da sua possibilidade.
Tal questão faz parte da tese que estou desenvolvendo no Centro de Estudos Sociais em Coimbra, sob a orientação do Prof. Boaventura de Sousa Santos, em que desenvolvo uma pesquisa acerca dos limites das políticas de esquerda durante o período de Correa. Considerando que o Equador, devido ao seu caráter colonial e não obstante seu atraso ainda maior que o brasileiro, também enfrentou um processo de economia colonial-exportadora numa economia tipicamente extrovertida. Isto posto obviamente em termos teóricos, em termos práticos analiso as políticas de extração de petróleo, matéria-prima que é historicamente o grande motor econômico do país. As políticas públicas necessitam ser combinadas com um projeto reformista e condicionadas ao cofo do horizonte revolucionário, caso contrário, estamos fadados ao fracasso.
IHU On-Line – Qual é o clima no que diz respeito às eleições no Equador?
Elaine Santos – Aparentemente o clima é tranquilo, as campanhas eleitorais começaram na última semana e sinceramente acredito que os opositores a Lenin Moreno (Alianza Pais), que é o candidato que tenta suceder Rafael Correa, são débeis em termos de proposta política para conseguir convencer a população nas urnas.
IHU On-Line – Como se identificam ideologicamente cada um dos candidatos ao pleito presidencial? Quais são suas propostas centrais?
Elaine Santos – Focarei nos mais relevantes.

O sucessor de Correa

Lenin Moreno é o que aparece na frente nas últimas pesquisas divulgadas. Segundo a agência de pesquisa Centro de Estudios e Datos – Cedatos, ele aparecia, em dezembro, com 35,6% dos votos, sendo a maior parte deles em CuencaGuayaquil e Quito. Ele é o candidato escolhido para suceder Rafael Correa, portanto sua plataforma principal é dar prosseguimento àquilo que alguns denominaram Socialismo do Século XXI, mas que agora já aparece como um conceito um pouco perdido nas brumas.

O banqueiro

O segundo candidato e talvez o maior adversário de Lenin na eleição de 2017 é o banqueiro e Dirigente da Associação dos Bancos Privados, Guilhermo Lasso Mendoza, candidato do Movimento Criando Oportunidades – Creo. Na última sondagem ele apareceu com 22,3% das intenções de voto.

A opositora de Correa

Cynthia Viteri é formada em Direito e atualmente é apresentadora de televisão e aparece com 10% dos votos. Representa a coalizão do Partido Social Cristão junto com os Movimentos Soma, Podemos e Avança. É oposição incisiva ao atual presidente e já chegou a ofendê-lo por meio das redes sociais. Foi expulsa da Venezuela por intromissão em problemas internos e por desrespeitar as normas migratórias. A candidata representa a ideia de um Estado de direito que não comporta ideologias, embora até agora não esclareceu como isso calharia.

A esquerda descontente

Paco Moncayo representa a esquerda descontente e foi definido por Correa como um “homem honesto”; é o terceiro candidato com 7% dos votos. Em 1998, quando saiu do exército, foi eleito deputado nacional através do partido Izquierda Democrática. Foi prefeito da capital Quito de 2000 a 2009, tem o apoio da esquerda insatisfeita com Correa e é muito forte em Quito. Isso é positivo caso aconteça um segundo turno. Sua candidatura tem apoios importantes como o de Alberto Acosta, que foi ministro da Energia de Correa logo no primeiro mandato, Gustavo LarreaRoxana PalaciosUnião Nacional de Educadores – UNEMorocho, que é atual presidente da Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador – Conaie, além da organização que forma o acordo Nacional pela Mudança composta pela Esquerda Democrática, Unidade Popular, Pachakutik, os movimentos Ação Social e Solidária – Mass, Vive, Democracia Sim, entre outros. Atualmente ele se define como crítico das políticas correístas e busca, em conjunto com seus apoiadores, uma alternativa política à chamada Revolução Cidadã.
Os outros candidatos não representam nem 4% das intenções de voto e estão amadurecendo seus diálogos na disputa eleitoral política, vislumbrando as próximas disputas nas cidades.
Mauricio Rodas é assumidamente da direita, algo positivo neste caso, pois evita enganos caso seja eleito algum dia. Ele renunciou a sua candidatura em 2016 e declarou apoio ao candidato Lasso, caso exista um segundo turno. Outro é Ivan Espinel Molina, médico de profissão, com um mestrado em administração.
O iniciante Washington Pesántez começou sua carreira política após se desempenhar como Promotor Geral da Nação e apresenta sua candidatura em movimento fundado por ele mesmo, a União Equatoriana. Ele se mostra progressista, todavia muito distante do Alianza País de Lenin Moreno.
IHU On-Line – Qual o grau de maturidade democrática do Equador? Acabaram os riscos de golpes de estado ou a permanência de Correa durante seus dois mandatos é fruto de sua desenvoltura política?
Elaine Santos – Sim, as políticas correístas criaram um nível de governabilidade importante. Contudo, é necessário acompanhar o desenrolar e a correlação de forças no país, já que mesmo tendo amadurecido em alguns aspectos, as esquerdas também passam por um momento de dispersão e perda de suas forças – isto fica evidente nas militâncias e seus comportamentos desorientados ante as derrotas.
IHU On-Line – Quais sãos os desafios e as garantias para a manutenção do Equador como um Estado Plurinacional e defensor dos Direitos da Natureza?
Elaine Santos – O reconhecimento da natureza como um sujeito de direitos trouxe à tona uma série de questões, ainda que seja por meio da mudança na dogmática jurídica, que foi realizada a partir de uma demanda social indígena de mudar a visão sobre a natureza e sua relação com ela, nos permitindo questionar a lógica atual em que a natureza é compreendida apenas como uma cesta de matérias-primas disponíveis infinitamente à exploração para o enriquecimento de uma minoria. Em um pano de fundo, isso pode ser vislumbrado como resistência e questionamento ao sistema econômico vigente.

Estado Plurinacional

Quanto ao Estado Plurinacional, é um exemplo importante, plasmado nas Constituições da Bolívia e do Equador e apesar de representar um desenvolvimento no reconhecimento dos direitos tradicionais, a Constituição também possui contrapontos, pois serve como mecanismo de inclusão dentro do aparelho do Estado, que mesmo quando governado pelas classes não burguesas, acaba por ser engolido pela essência estatal arraigada das relações capitalistas. No caso equatoriano em especial, temos o reconhecimento como um marco, entretanto sua efetividade ainda é falha e parece existir uma diferença abissal entre defender a reorganização do Estado e sua representação na diversidade dos povos e a inserção e reconhecimento destes povos apenas como cooptação, ou seja, estão representados de forma limitada, sem qualquer intervenção realmente autêntica. Vale relembrar o quanto os direitos indígenas reconhecidos na Constituição Equatoriana de 2008 foram desrespeitados ao longo desta década, repousando-se apenas sob o papel.
IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?
Elaine Santos – Sim. Gostaria de enfatizar que apesar de estarmos cansados frente a esse ciclo de esgotamento que nos fatiga diariamente no capitalismo que “tira onda” de justo, nossas energias utópicas também se renovam. Principalmente quando percebemos a quantidade de jovens estudiosos debruçados na temática latino-americana, em especial no Equador, empenhados com afinco, por meio de ideias e lutas, que nos levem à transformação/emancipação social das classes oprimidas. Entre eles destaco o colega Jefferson Pecori Viana, que possui um trabalho bastante significativo acerca das Relações Exteriores no Equador, meu companheiro no Centro de Estudos Sociais – CES, Fabian Cevallos, que é equatoriano e que está ativamente ao lado dos que sofrem. Além de muitos outros, Josilane LimaAline VasconcelosRafael FernandezDaniel FaggianoPatrick MarianoRodrigo ChagasFelipe HenriqueVladmir SilvaThais LapaMarcio Mendes e Socorro Silva, que é da educação popular na América Latina, todos os companheiros que buscam construir uma sociedade edificante mais justa e que talvez muitos de nós, apesar de jovens, não viveremos.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Antonio Gramsci em animação -


O mundo pode ser de outra maneira?


Muito simpática a animação da história do pensamento de Gramsci contendo, de forma simples, suas principais ideias e convicções. Em sala de aula, é possível trabalhar de forma interdisciplinar com conteúdos acerca da Segunda Guerra (História), na Sociologia a formação dos pensamentos revolucionários nesse período e como o video possui 15 minutos e está em espanhol podemos utiliza-lo como forma de tradução e produção de texto. Deixo um trecho deste grande intelectual. 

Em todas as sociedades de classe há relações de força que se alteram. A Revolução deve ser uma grande alteração intelectual e moral. Os atores sociais precisam estar em acordo com tal alteração, sendo necessário um sujeito revolucionário que é também coletivo, ou seja, não separamos o sujeito do objeto. A práxis é diária e sempre contra hegemónica. 






domingo, 22 de janeiro de 2017

Não sejas Trump!!!! mas também não sejas incoerente!

No dia 20 de janeiro tomou posse o novo e polêmico presidente dos Estados Unidos Donald Trump, a noticia tão alarmada no mundo correu como manda o protocolo. No seu discurso de 15 minutos Trump reforçou a sua política protecionista na tentativa de superar a crise e colocar os Estados Unidos no topo ou em Primeiro Lugar no mundo. Já era o esperado, Trump foi eleito democraticamente, ainda que dentro da democracia burguesa, pessoas votaram e concordaram com visão política há de se questionar isto àqueles que discordam da visão conservadora do mundo e acho justo apoio e assino junto, mas vejamos as formas de encarar tal luta.

Coimbra - 21 de janeiro, arquivo pessoal.

No dia 21 de fevereiro, um dias após a posse, ocorreram varias manifestações em Portugal "Não sejas Trump, parar o machismo e construir a igualdade" grupos feministas mulheres e também homens marcharam nas ruas de várias cidades portuguesas contra o conservadorismo demonstrado por Trump em seus discursos.

Fui na manifestação em Coimbra, cidade em que atualmente vivo, não sou organizada politicamente aqui, em todo caso estranhei quando vi uma marcha chamada "Não sejas Trump contra o machismo, o racismo" e até a desigualdade, porque acredito que tais discriminações não podem ser personificadas, estão no bojo estrutural de um sistema chamado CAPITALISMO, acho que o questionamento deve iniciar por aí. 

Assustou-me também ver tantas organizações de esquerda ali reunidas falando da inclusão entre eles e para eles, onde estão os negros? onde estavam os imigrantes? qual o ensinamento que Portugal tem a dar para o mundo no que tange a igualdade? um país que divulgou em seu último relatório, no final de 2016, não existir racismo em Portugal, quando sabemos que a realidade não é bem assim. 


Arquivo SIC noticias - 21 de janeiro

De todo o modo, lá estava eu, talvez a pessoa com a epiderme mais escura desta manifestação, unida a um grupo de pessoas que sequer enxergam o racismo e o machismo no seu cotidiano, representada por mulheres feministas brancas que leem poesia em manifestações contra o Trump, enquanto isso outras mulheres são agredidas e mortas nas periferias do mundo. Não me sinto representada em meio a isto e reitero que sou integralmente a fa vou das manifestações que coloquem em suas pautas direitos que não sã respeitados. Só a luta muda a vida!! Tenho esta certeza. Entretanto, olhemos para o lado, será que o Trump fala sozinho? ou muitas pessoas comungam de valores iguais, que valores capitalistas no seu extremo.

Vejam só mesmo numa manifestação pró igualdade não temos o mínimo de igualdade, o que temos são discursos soltos, pessoas "frasistas" já conhecidas dentre as associações à esquerda e talvez distantes das mulheres e trabalhadores que os mesmo exaltam chamando-os de "classe", quem é a classe? Talvez seja esta a hora de nomearmos a classe, apontar os privilégios ou queremos continuar no conforto das discussões e seminários em cafés.

O que pretende esta esquerda que não consegue reunir um grupo diverso e inclusivo em suas manifestações?? para quem falamos??

Se queremos outra sociedade devemos pensar e agir nela desde já...na nosso rotina, sendo contraponto em todos os espaços que vivemos. Caso contrário, seremos sempre vistos como uma certa esquerda festiva, pouco respeitada na sociedade, pouco envolvida diretamente e cotidianamente com a luta pela sobrevivência. Em tempos manter o espirito critico parece ser de extrema importância, principalmente quando defendemos os valores para além do capital, entretanto mal conseguimos olhar ao redor. 

ps. Nem todos que usam a camisa com a imagem do Che conhecem fielmente àquela luta. 

ES

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Michael Moore em Trumpland


O famoso Michael Moore estrela, escreve e dirige este filme com 73 minutos, filmado e editado semanas antes das eleições nos Estados Unidos. Como uma espécie do Show Man Moore e um formato de stand up comedy o filme surpreende colocando eleitores pró e contra Donald Trump ampliando o debate eleitoral para qual o sentido real das eleições, porque votamos?, porque temos determinados opiniões de empatia com alguns candidatos? o que norteia nossa escolha nas urnas?

Apesar da importância do debate para que esteve lá presente e da forma risonha de Moore em cena satirizando as ultimas políticas anti imigrantes e americanos muçulmanos, o documentário é um tanto embaraçoso para quem os assiste. Principalmente quando estes são oriundos dos países que sofrem as consequências das políticas norte americanos, ficamos com a impressão que temos nossas vidas indiretamente decididas por meio de patetices. Em todo caso é um filme sincero e para todos, apesar do título Moore não torna o documentário uma campanha depreciativa ao Trump.

Vale a pena assistir, todavia, sem grandes expectativas. 



Poetas Hispanoamericanos


Conhecendo nossa história...

César Vallejo, poeta peruano neto de mulheres indígenas, possuía um pessimismo cheio de ternura, se sentia também responsável por uma parte da dor dos homens, Vallejo é capaz de amar universalmente. Uma das grandes figuras do século XX



Todos meus ossos são alheios
talvez os tenha roubado!
Dei pra mim mesmo o que talvez estivesse 
designado para outro;
e penso que, se não houvesse nascido,
outro pobre tomaria café!
Sou um mal ladrão....Onde vou parar!


E neste hora fria, em que a terra
recende a pó humana e é tão triste,
quisera eu bater em todas as portas
e suplicar não sei a quem, perdão, 
e cozinhar-lhe pedacinhos e pão fresco
aqui, no forno do meu coração...!




Para saber mais....



terça-feira, 10 de janeiro de 2017

As eleições de 2017 no Equador, uma veia aberta na América Latina




Desde que iniciei meus estudos acerca do Equador em 2006 compreendi que o país se destacava por seu protagonismo indígena, por sua instabilidade política e pela forte presença da temática ecológica nos discursos. Desde 2006, quando da primeira eleição de Rafael Correa com vasto apoio da população, tenho acompanhado os acertos e os deslizes deste governo, bem como os caminhos da América Latina de um modo geral. Com o apoio da população e o compromisso de refundar o Estado foi reeleito e em 10 de Agosto de 2009 declarou em Assembleia Nacional.
“Nossa revolução é de quem toca o motor da história: os seres humanos, estes que jamais serão vítimas em nosso país das manobras neoliberais e do capitalismo selvagem”
Correa realizou medidas importantíssimas no país, negociou os contratos com as petroleiras, também renegociou em um processo pouco comum nos países latino americanos o calculo da divida externa e obtendo êxito impulsionou uma inversão estatística no que tange a educação, moradia e acessos à população. Segundo os dados no INEC nos últimos 8 anos 1,3 milhões de equatorianos saíram da pobreza por meio do consumo isto equivale a 32,3% do total populacional e em 2014, 8 entre cada 10 habitantes tiveram acesso a água potável.
Todavia, nos últimos anos o presidente teve sua imagem desgastada perante as comunidades indígenas e isto ocorreu em grande parte por sua decisão de explorar o petróleo do Parque Yasuní, algo que prometera não fazer (Fuser, 2014). Foi acusado de traidor e extrativista dividindo intelectuais e movimentos indígenas, entretanto, é bom tomar cuidado neste ponto, pois muitos autores extremistas ecologistas quase faziam a defesa do “voltemos a caminhar sobre quatro patas no reencontrar com a natureza” e desconsideravam que o sistema econômico vigente leva ao desenvolvimento, o ponto fulcral é que ele faz isto tão somente sob a égide da barbárie, sem contar a própria historia do Equador e demais países latino americanos que embasou-se em uma economia agro exportadora e desta forma, como construir novas bases econômicas que permita a estes países sair desta condição colonial e dependente. Esta sempre foi a indagação central, como investir em mudanças estruturais de modo a ter uma alternativa real e prática que possa superar a condição extrativista, Correa o fez?
E a cada ano se reafirmava a máxima que o subdesenvolvimento não é um trecho para o desenvolvimento, o sistema funciona nestes moldes, sem mudança estrutural nunca haverá mudança ciclópica. Este é o primeiro de outros artigos que seguirão analisando a conjuntura do país, que em 2006 se declarou anticapitalista e anti neoliberal e que ao longo de uma década demonstrou que mesmo sob tentativa de golpe militar em setembro de 2010, quando policiais protestavam contra a Lei Orgânica de Serviços Públicos e Carreira Administrativa que eliminava alguns incentivos para os trabalhadores, mesmo sob múltiplos protestos indígenas em 2015 que alegavam que o governo se usava da linguagem de esquerda para retirar direitos seu ciclo, que durou 10 anos, chegou ao final apontando que estamos no capitalismo desde a periferia e sabemos bem como é viver em colônias (Ouriques, 2015).
O que quero dizer é que as estruturas do subdesenvolvimento não podem admitir mudanças dentro da ordem. E por mais intensos e importantes que sejam os processos de modernização, reformas e redistribuição de renda, como foram aqui mencionados. Findado tais processos percebe-se que permanecemos com a mesma estrutura que nos arrimou, ou seja, o subdesenvolvimento. Ou para os otimistas, somos os emergentes, aqueles que somente se desenvolvem dentro dos delineamentos do subdesenvolvimento. E foi assim que Rafael Correa passou por maus bocados defronte os movimentos sociais que o apoiaram profusamente no primeiro mandato. Não é possível esquecer dos seus desmandos quase bíblicos acerca da questão de gênero como uma calamidade ensinada aos jovens, levou milhares de indígenas às ruas contra os inúmeros projetos do Governo Federal e desde o seu primeiro mandato quando se exaltava a Constituição mais avançada da América Latina que reconhecia os Direitos da Natureza e a Plurinacionalidade do Estado na prática a resposta do presidente aparecia por meio do recrudescimento no trato com os povos originários.
Como podemos notar há uma serie de contradições postas que precisam ser analisadas, neste sistema metabólico constituído por capital, trabalho e Estado. Os governos latino americanos possuem em comum o fato de ter dado ênfase maior as políticas sociais enquanto que, BolíviaEquador e Venezuela se dispuseram a consultar a população por meio dos plebiscitos que, a meu ver, é uma forma de aproximar as pessoas dos debates políticos. Contudo, o Estado também se legitima por meio da ilegalidade na sua constituição mais intima, estando mesmo acima da lei algo que foi bastante perceptível no golpe jurídico realizado no Brasil em 2015, em nome da legalidade e da falsa democracia (Mészáros, 2015, p.46). A questão é a não excepcionalidade deste fato, ao contrário, tal ação é sempre sine qua non para qual o Estado exerce seu poderio e sua instauração. Descolado da realidade o Estado aparece como algo alheio à própria população que observa seus ditames paralisada ante a possibilidade de alterar profundamente as relações desta tríplice força.
Cabe ressaltar que a América Latina foi governada mais de 10 anos por governos titulados à esquerda. Rafael Corrêa, após 10 anos no poder, não concorrerá a eleição em 2017 e até o presente momento as pesquisas dão como vitorioso no dia 19 de fevereiro de 2017 o seu sucessor Lenin Moreno, que foi seu vice e é formado em administração pública. Correa teve um período considerado áureo em seu primeiro mandato, foi o primeiro presidente a concluir seu mandato até o final uma vez que de 1992 a 2006 houve uma série de 3 presidentes derrubados.
Segundo a agencia de pesquisa Cedatos a corrupção é um tema que preocupa os equatorianos e é um fator condicionante como escolha de um candidato aproximando-se do período eleitoral. A mesma agência de pesquisa divulgou ao final de dezembro de 2016 que por ora, quem lidera as pesquisas com 32% dos votos é o candidato que sucede o atual presidente, Lenin Moreno, integrante do movimento Alianza País (AP) na sequencia aparece o banqueiro e dirigente da Associação dos Bancos Privados Guilherme Lasso do Movimento criando oportunidades (CREO) com 22% das intenções de voto, sendo esta sua segunda chance de presidir o país. A oposição intencionará um segundo turno, com chances de unificação para fazer ruir a suposta continuidade do projeto da Revolução Cidadã.
Serão oito chapas em disputa a ocupar o Palácio de Carondelet e a campanha começou no dia 03 de janeiro, logo ainda há muita água neste moinho.
Guillermo Lasso e Andrés Páez (Creio - Soma),
Paco Moncayo e Monserrat Bustamante (Acordo pela Mudança),
Dalo Bucaram e Ramiro Aguilar (Partido Força Equador)
Cynthia Viteri e Mauricio Pozo (Partido Social Cristão)
Lenín Moreno e Jorge Glas (Movimento Aliança País),
Washington Pesántez e Álex Alcívar (Movimento União Equatoriana),
Iván Espinel e Doris Quiroz (Movimento Força Compromisso Social)
Patricio Zuquilanda e Johnnie Jorgge (Partido Sociedade Patriótica).
Referências
  • Fuser, Igor. (2014). Entre a Pacha Mama e o desenvolvimento: a luta de ideias nos conflitos do Tipnis (Bolívia) e Parque de Yasuní (Equador). Comunicação apresentada no 38o Encontro Anual da Anpocs (Associação Nacional de Pós-graduandos e Pesquisa em Ciências Sociais)
  • Mészáros, István. (2015). A montanha que devemos conquistar. Editora Boitempo, São Paulo.
  • Ouriques, Nildo. (2015). O colapso do figurino francês: Crítica às ciências sociais no Brasil. Editora Insular. 2ª edição
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