Universidade Inclusiva é pouco para nós...
Quando as mulheres
negras, por meio de diversos escapes, alçam e ocupam determinados espaços hegemonicamente
brancos, como o espaço dos debates acadêmicos é sempre uma consternação entre
todos. Primeiro porque não é comum protagonizarmos nada, nem mesmo as nossas
ações no mundo podem ser relatadas por nós, somos sempre o objeto exótico do estudo
alheio. Segundo, porque ocorre um desvelamento que produzimos conhecimento e queremos
outra sociedade. Parece muita ousadia para àqueles que se acostumaram a retirar
nossa humanidade.
E sim, nosso debate é
marxista! E não poderia deixar de ser já que, acostumadas a sermos
vilipendiadas e excluídas o tempo todo, só podemos pensar a sociedade a partir
de outro projeto, entendendo que o sistema atual enraizado no racismo, no
machismo que vivemos faz parte de uma razão político econômica. Para nós, grupos
à margem, que só temos em comum a exclusão, a teoria só pode servir para construir
outra sociedade. O posicionamento de classe é uma composição política e não
apenas uma condição social.
Falar de cotas não é nem
o início de uma discussão racial séria, portanto, não nos tratem como
quantidades de seres apolíticos na composição da uma “esquerda”. Representação
importa e muito! Mas não podemos achar que compor numericamente mesas com
mulheres negras, indígenas ou seja lá qual falseamento da realidade usem para
nos fragmentar, mudará nossa realidade concreta. Ao contrário, esta falsa
representação nos incapacita de agir e de falar àquilo que ansiamos e nunca
conseguimos, que é a mudança radical da sociedade. São violências múltiplas que
nos unem, são múltiplas as contradições que nos atravessam, mas o capitalismo
exerce sua força nos dividindo, estamos todos sob a mesma égide e o ciclo de
dominação se fecha quando cada um começa a lutar por sua questão
individualizada, seu sofrimento hierarquizado, em uma luta de todos contra
todos à esquerda validando a eficácia do sistema capitalismo.
Em contrapartida, estamos
entre (e do lado) os subalternos, os oprimidos, a nossa composição de classe
que é heterogênea, mas conectada em suas opressões. Esta é a noção de
interseccionalidade o “nó” do termo cunhado pela jurista afro americana
Kimberlé Crenshaw (1989), todas as múltiplas violências sofridas se encontram, se
sobrepõem e colocam a mulher negra na base desta pirâmide, daí a morte do seu
pensamento, do seu posicionamento e dos seus corpos. Todavia, diluir a premissa
de classe deturpa a nossa possibilidade de luta, somos negras, também
trabalhadoras, também mulheres, também periféricas; somos diversas lutas de uma
mesma classe com seus sofrimentos e suas especificidades, mas somos uma classe.
Logo, nossa luta
antirracista e feminista é, em seu plano central, contra o capitalismo. Falar
de desigualdade sem falar da exclusão de género e da questão racial é como não
tocar na questão central da exclusão e compreender o individuo com sua consciência
autónoma, uma volta ao hegelianismo,
que teve seu contributo, mas que o filósofo alemão já contemplou e transpôs ao
tocar na escravidão como uma das formas de exploração do capital.
Posto isto, estamos na
Universidade, ela foi ocupada, bem como todos os outros espaços pelos quais
passamos, contrariamos as estatísticas, mas não abandonaremos o nosso estatuto
e tampouco a conexão com a totalidade.
Nos respeitem, porque nossos passos vêm de
longe, somos Lélia Gonzalez, Jurema Wernerck, Angela Davis, Audre Lord,
Crenshaw, Izildinha Baptista Nogueira, Cláudia Ferreira (que mulher negra
foi morta e arrastada em via pública pela polícia carioca) somos também Alberto
Guerreiro Ramos, Clóvis Moura, José dos Santos, Chimamanda, Lígia Maria da Costa Cambraia, Lumumba, Marx, Lenín, Mariatégui, Darcy Ribeiro, as guerrilheiras
nigerianas Nwanyeruwa e todos os
que lutaram e lutam pelo fim do capitalismo.
Elaine Santos
Claudia Cambraia
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